segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Buchner e a ruptura com o romantismo


O romantismo define-se a partir dos últimos 25 anos do século XVIII. Na Alemanha, em 1774, Goethe publica Os sofrimentos do jovem Werther, lançando as bases definitivas do sentimentalismo romântico e o escapismo pela via do suicídio; em 1781, Schiller lança Os salteadores, inaugurando a volta ao passado histórico e mais tarde, o drama Guilherme Tell, transforma seu personagem em herói nacional na luta pela independência. Na Inglaterra, o romantismo se manifesta nos primeiros anos do século XIX, com destaque para Lorde Byron e Walter Scott, mas é justamente da Inglaterra que surge a talvez maior inspiração do romantismo: Shakespeare. Porém, se coube a Alemanha e a Inglaterra, papel pioneiro, coube à França o papel de divulgar o romantismo.
Georg Büchner nasceu em Goddelau, Darmstadt, Alemanha, em 17 de outubro de 1813. Seguindo a tradição da família, começou a estudar medicina em 1831. Seu espírito revolucionário logo encontraria um meio de expressão na literatura. Sua intenção de promover uma insurreição em Hesse sob o lema: ´Paz às cabanas! Guerra aos palácios!´, foi motivo de uma ordem de prisão, e ele refugiou-se na casa do pai. Ali escreveu A morte de Danton (1835), uma análise ao mesmo tempo exaltada e pessimista das causas do fracasso da Revolução Francesa, e que foi o primeiro drama realista alemão. Entre as obras que vieram a seguir, todas publicadas depois de sua morte, destacam-se a comédia Leonce e Lena, uma sátira às idéias românticas, e a novela Lenz, homenagem a J. M. Reinhold Lenz, membro, como Büchner, de um movimento literário conhecido como ‘a jovem Alemanha’. Com Woyseck (1836), sua última peça influenciou o drama social que veio com os naturalistas e expressionistas. Com um argumento baseado em fatos reais, o autor denuncia cruamente a opressão dos humildes.
Perseguido pela polícia, Büchner fugiu para a Suíça e morre em Zurique em 19 de fevereiro de 1837, com apenas 23 anos de idade.
Woyzeck supõe-se inacabada em função da morte precoce do autor, ao mesmo tempo é considerada sua obra-prima, contendo elementos que apareceriam na dramaturgia mundial apenas nas vanguardas do século XX. A peça conta à história de Woyseck, um rapaz que perde os pais e se torna ajudante numa fábrica de perucas. Não se afirma na profissão e para escapar à fome entra para o exército. Aceita dinheiro de um médico para fazer uma experiência: comer apenas ervilhas. O médico exulta ao ver e anotar a degradação em seu corpo. Sua mulher lhe é infiel. Seu superior lhe chama de imoral, pois não é casado. Seu trabalho é degradante, as autoridades são prostituídas e a vida familiar é um paraíso às avessas. Passa doze anos pontuados por detenções por indisciplina. É dispensado. Arranja uma amante que tem outros homens. Desempregado, pede esmolas e dorme ao relento. Numa crise de ciúmes mata a amante, acaba por ser decapitado em conseqüência de ter matado a mulher.
A peça tem uma estrutura fragmentada, irrepresentáveis, a não ser se dispense uma representação realista; há uma atmosfera invisível da morte que excita os sentidos, ao povo cabe um papel de coro, que em suas opiniões e indiferenças penetram, segundo Décio de Almeida Prado numa inquietude shakespeariana. E hesita entre a admiração e a repulsa pelo espetáculo da violência.
Escapa, em sua áspera originalidade, à atmosfera romântica. Büchner foi um precursor, segundo Gassner, tanto do naturalismo quanto do expressionismo na dramaturgia, embora sua vida tenha sido cortada antes que pudesse desenvolver as possibilidades de qualquer dos estilos. Tinha o desespero quanto à impureza da vida dos naturalistas e a técnica expressionista de substituir situações elaboradamente desenvolvidas por cenas breves psicologicamente sugestivas. Foi, com efeito, um anti-romântico em seu ambiente romântico. Sua filosofia do caráter, que brotava da perspectiva da ciência mecanicista do século XIX, constitui uma nítida ruptura com o heroísmo da “tempestade e ímpeto” (sturm and drang).

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