quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Cronologia da peças de Shakespeare


Lista de peças com datas estimadas:

(As datas entre parênteses indicam somente a data da primeira publicação.)
1590 (1598) Henrique VI, parte 1
Registrado no Stationers' Register em 25 de Fevereiro 1598.
1590 (1594) Henrique VI, parte 2
1590 (1595) Henrique VI, parte 3
Parodizado por Robert Greene em 1592.
1592 (1602) Ricardo III
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1592 (1623) A Comédia dos Erros
1593 (1594) Titus Andronicus
De acordo com a primeira edição publicada, foi encenada por uma empresa que havia a guardado, no ínicio de 1593. Em 1594, Philip Henslowe refere-se à Titus Andronicus como uma nova peça. Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1593 (1623) A Megera Domada
1594 (1623) Os Dois Cavalheiros de Verona
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1594 (1598) Trabalhos de Amores Perdidos
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1591-1596 (1597) Romeu e Julieta
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1595 (1597) Ricardo II
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1595 (1600) Sonhos de Uma Noite de Verão
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1596 (1622) Rei João
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1596 (1600) O Mercador de Veneza
Registrada no Stationers' Register em 22 de julho de 1598 e presente na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1597 Henrique IV, Parte 1
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598).
1594-1597 (1603?) Love's Labour's Won
Na lista elaborada por Francis Mere das peças de Shakespeare (1598). Uma das peças atribuídas à Shakespeare que se encontra perdida.
1598 (1600) Henrique IV, Parte 2
1599 (1600) Henrique V
O coro da peça manifesta esperança perante à expedição irlandesa de 1599 do Conde de Essex.
1599 (1623) Júlio César
Mencionada por Thomas Platter em 1599.
1599 (1600) Muito Barulho por Nada
1599 (1623) Como Gostais
Registrada no Stationers' Register em Agosto de 1600.
1597-1600 (1602) The Merry Devil of Edmonton
1599-1600 (1603) Hamlet
O Stationers' Register em Julho de 1602 a descreve como "encenada recentemente".
1602 (1623) Noite de Reis
1602 (1609) Tróilo e Créssida
1603 (1623) Tudo Bem Quando Termina Bem
Nenhuma referência contemporânea.
1603 (1622) Otelo
Encenada em Novembro de 1604.
1603-06 (1608) Rei Lear
No Stationers' Register em Novembro de 1607.
1603-06 (1623) Macbeth
1603 (1623) Medida por Medida
1606 (1623) Antônio e Cleópatra
1607 (1623) Coriolano
1607 (1623) Timão de Atenas (provavelmente revisado por Thomas Middleton)
1608 (1609) Péricles, Príncipe de Tiro (provavelmente revisada por George Wilkins)
Stationers' Register em Maio de 1608.
1609 (1623) Cimbelino
1594-1610 (1623) Conto do Inverno
1611 (1623) A Tempestade
1612 (1623) Henrique VIII (provavelmente co-escrito por John Fletcher)
Encenada em 29 de junho de 1613, quando o Globe Theatre foi incendiado.
1612 (1728) Cardenio (escrito em colaboração com John Fletcher)
1612 (1634) Os Dois Nobres Parentes (em colaboração com John Fletcher).
As seguintes peças foram atribuídas a Shakespeare, mas são na verdade de autoria diferente ou incerta
1592-1595 (1844) Sir Thomas More
Escrita originalmente por Anthony Munday e por Henry Chettle, e revisada talvez dez anos mais tarde por Thomas Heywood, por Thomas Dekker e (talvez) por William Shakespeare, cuja escrita foi identificada provisóriamente como " Mão D" (Hand D) no manuscrito.
1600 (1600) Sir John Oldcastle
O diário de Philip Henslowe diz que foi escrita por Anthony Munday, por Michael Drayton, por Richard Hathwaye e por Robert Wilson na colaboração.
1604 (1605) The London Prodigal
Atuada pela companhia de Shakespeare e publicada sob seu nome, mas os estudos estilísticos desconsideram essa nota.
1605 (1608) A Yorkshire Tragedy
Atuada pela companhia de Shakespeare e publicada sob seu nome, mas os estudos estilísticos desconsideram essa nota. O autor mais provável é Thomas Middleton.

O Bardo inglês: William Shakespeare


William Shakespeare nasceu, provavelmente em 23 de abril de 1564 e falaeceu em 23 de abril de 1616. É considerado o maior poeta e dramaturgo da língua inglesa e o "inventor da tragédia moderna". É chamado frequentemente de "poeta nacional" da Inglaterra e de "Bardo de Avon" (ou simplesmente The Bard, "O Bardo").

De suas peças, nos chegaram 38, mais 154 sonetos, 2 longos poemas narrativos e diversos outros poemas. Suas peças foram traduzidas para os principais idiomas do plantea e são encenadas mais do que qualquer outro dramaturgo da história.

Muitos consideram Hamlet, Romeu e Julieta, MacBeth, Otelo e Rei Lear, suas obras primas, mas é impossível não dar o mesmo crédito a m Mercador de Veneza, ou uma Megera Domada, ou ainda um atordoante Ricardo III. No entanto, é certo dizer que Romeu e Julieta, por ser considerada a história de amor por excelência, e Hamlet, que possui uma das frases mais conhecidas da língua inglesa: "To be or not to be: that's the question", que proporciona tantas e tantas discussões, são suas obras mais conhecidas.
Shakespeare nasceu e foi criado em Stratford-upon-Avon, e aos 18 anos casou-se com Anne Hathaway, com quem teve três filhos: Susanna e os gêmeos Hamnet e Judith. Entre 1585 e 1592 Shakespeare começou uma carreira bem-sucedida em Londres como ator, escritor e um tornou-se um dos proprietários da companhia de teatro conhecida como The King's Men. William Shakespeare retornou para sua cidade natal em 1613, onde morreu três anos depois.

Sobre sua vida privada existem muitas especulações sobre assuntos como a sua aparência física, sua sexualidade e suas crenças religiosas e, sobretudo, sobre se algumas das obras foram de fato escritas por ele.
Shakespeare produziu sua obra teatral entre 1589 e 1613. Suas primeiras peças eram, sobretudo comédias e dramas históricos, gênero que ele levou ao ápice da sofisticação e do talento artístico ao fim do século XVI, criando uma verdadeira "escola" sobre a qual muitos românticos a partir do final do século XVIII iriam seguir.

Porém suas obras-primas foram as tragédias. Entre 1608 e 1613 escreeveu peças como Hamlet, Lear e MacBeth, consideradas algumas das obras mais importantes da dramaturgia universal.

Em sua última fase, escreveu tragicomédias, também conhecidas como romances, e colaborou com outros dramaturgos. Diversas de suas peças foram publicadas, em edições com variados graus de qualidade e precisão, durante sua vida.

Em 1623 surge uma primeira compilação da obra teatral de Shakespeare. Dois de seus antigos colegas de palco publicaram o First Folio, uma coletânea de suas obras dramáticas que incluía todas as peças (com exceção de duas) reconhecidas atualmente como sendo de sua autoria.

Shakespeare foi um poeta e dramaturgo respeitado em sua própria época, mas sua reputação só viria a atingir o nível em que se encontra hoje no século XIX. Os românticos, especialmente, aclamaram a genialidade de Shakespeare, e os "vitorianos" o idolatraram como um herói nacional, com uma reverência que Bernard Shaw chamava de "bardolatria".

Suas peças permanecem extremamente populares hoje em dia , e são estudadas, encenadas e reinterpretadas constantemente, em diversos contextos culturais e políticos, por todo o mundo. Shakespeare parece ser permanentemente contemporâneo, seus personagens são obcecados, mas, ao mesmo tempo possuem um caráter de marionete ao longo das tramas. Suas peças tem um estilo grotesco e caprichoso, em que a natureza é arbitrária, disforme e extravagante na estrutura. Em Shakespeare o prazer do narrador é insaciável, tal e qual uma Sherazade em introduzir constantemente mais e mais episódios, comentários e excursos novos; os saltos cinematográficos na história, antecipam em quatrcentos anos as narrações episódicas, épicas e multiplas que julgamos somente o cinema ter a capacidade de contar.

Ao mesmo tempo, politicamente, Shakespeare defende o sistema, chega mesmo a dizer em uma de suas peças "Quando a hierarquia é abalada...o sistema adoece". (Troilo e Cressida, ATO I, CENA 3). E é aí que reside sua filosofia social: Shakespeare vê o mundo através dos olhos de um cidadão abstrato, de mentalidade liberal, cético e, em alguns aspectos, desiludido; expressa concepções políticas que estão radicadas na idéia de direitos humanos – condena os abusos de poder e a opressão de que é vitima o povo comum, mas também condena os que chamam a arrogância e a prepotência. Em sua inquietação burguesa e receio de anarquia, expõe o princípio de “ordem” acima de todas as considerações humanitárias.

Certamente Shakespeare não era um revolucionário, tampouco um lutador por natureza, mas estava do mesmo lado daqueles que impediriam o renascimento de uma monarquia constitucional, auge de qualquer ideia de civilização nos séculos XVI e XVII.

Seus dramas históricos deixam suficientemente claro que seus interesses e inclinações vinculavam-no às camadas sociais que englobavam a classe média e a aristocracia de mentalidade liberal que adotara a concepção de vida da classe média, e que formavam um grupo progressista, em contraste com a antiga nobreza feudal que ainda existia.

Apesar de sua simpatia pela atitude da classe dominante em relação à vida Shakespeare manteve-se do lado do saudável senso comum, da justiça e do sentimento espontâneo. Cordélia é a mais pura consubstanciação dessas virtudes em pleno ambiente feudal. Personagens como Brutus, Hamlet, Timon e Troilo representam mais puramente o tipo quixotesco. O idealismo transcendente, a ingenuidade e a credulidade de todos eles são qualidades que têm em comum com Dom Quixote.

A única característica peculiar destes personagens, na visão shakespeariana, é o terrível despertar do embuste e da ilusão em que viviam e o infortúnio imenso que decorre do reconhecimento tardio da verdade. Seu anterior contentamento com as condições vigentes e o otimismo a respeito do futuro foram abalados, e, embora se mantivesse fiel ao principio de ordem, ao apreço pela estabilidade social e à rejeição do ideal heróico da cavalaria feudal, parece ter perdido a confiança no absolutismo maquiavelista e numa economia implacavelmente aquisitiva.

O desvio de Shakespeare para o pessimismo tem sido relacionado à tragédia do conde de Essex, na qual o patrono do poeta, Southampton, também estava envolvido, e também há referencias a outros eventos desagradáveis na história do tempo, como a inimizade entre Elizabeth e Maria Stuart, a perseguição dos puritanos, a gradual transformação da Inglaterra num Estado policial, o fim do governo relativamente liberal de Elizabeth e a nova tendência feudalista com Jaime I, o clímax no conflito entre a monarquia e a classe média de mentalidade puritana, como possíveis causas dessa mudança. O fato de que, daí em diante, o poeta sente mais simpatia pelas pessoas que são fracassos na vida pública do que por aquelas que têm boa sorte e sucesso. Tem particular afeto por Brutus, o trapalhão político e sujeito azarado. O pessimismo de Shakespeare ostenta as marcas de uma tragédia histórica.

Pode-se dizer quehá duas fases bem distintas na obra de Shakespeare:

O autor dos poemas “Vênus e Adônis” e “Lucrécia” ainda é um poeta que obedece ao gosto humanista em moda e escreve para círculos da aristocracia palaciana. A lírica e a Épica eram as formas literárias favoritas nos círculos palacianos cultos, ao lado das quais o teatro, apesar de um atrativo público, era considerado uma forma relativamente plebéia de expressão. A literatura renascentista inglesa à época era cortesã e diletante.

Quanto à origem desses littérateurs, sabemos que Marlowe era filho de um sapateiro, Peele de um ourives, Dekker de um alfaiate, e Ben Jonson teria começado exercendo o mesmo ofício de seu pai: pedreiro. Mas sabe-se também que somente uma proporção relativamente pequena de escritores era oriunda das camadas inferiores da sociedade, sendo a maioria proveniente da pequena nobreza, do funcionalismo e da rica classe de mercadores.

Na era elisabetana, a cultura literária se torna uma das mais importantes aquisições que se esperava de um homem bem-nascido. A literatura estava em voga e era de bom-tom discorrer sobre poesia e discutir sobre problemas literários. O estilo afetado (maneirista) da poesia da moda foi inteiramente transferido para a conversação ordinária; até mesmo a rainha falava nesse estilo artificial. E não falar naquele tom era considerado um sinal de falta de educação tão grave quando não saber falar francês [à época].

A literatura converte-se num jogo de sociedade, populariza-se, ganha as ruas, e consequentemente o teatro. Não por acaso a existência material de um dramaturgo escrevendo para os teatros públicos, que eram imensamente populares em todas as classes da sociedade, era uma constante no período que chamamos de teatro elizabetano. Era uma profissão estável e mais tranquila do que a de "escritor livre" que dependia exclusivamente de um patrocinador privado.

É verdade que as peças em si eram malpagas – Shakespeare adquire sua fortuna não como dramaturgo, mas como acionista de um teatro – porém, a constante procura nas bilheterias, garantiam uma renda regular. Assim, quase todos os escritores da época trabalhavam para o teatro pelo menos por algum tempo. Todos tentavam a sorte no teatro, embora muitas vezes com certo constrangimento.

No final da Idade Média inglesa, as grandes casas senhoriais tinham seus próprios atores – em emprego permanente ou temporário – bem como seus próprios menestréis.

Na era Elisabetana já começa uma busca desenfreada por patrocinadores. O antigo relacionamento patriarcal entre mecenas e protegido estava em processo de dissolução.

É justamente nesse época que Shakespeare aproveita a oportunidade para transferir seus talentos para o teatro.


Essa mudança para o teatro marca o início de uma segunda fase do desenvolvimento artístico de William Shakespeare. As obras que agora escreve já não possuem o tom classicizante e afetadamente idílico de suas primeiras produções, mas ainda se harmonizam com o gosto das classes superiores. São, em parte, crônicas altaneiras, grandes peças históricas e políticas, nas quais a idéia da monarquia é exaltada, em comédias alegres, exuberantemente românticas, que se desenrolam cheias de otimismo e alegria de viver, despreocupadas com os cuidados do dia-a-dia, num mundo completamente fictício.


Perto da virada do século, começa o terceiro e trágico período no desenvolvimento de Shakespeare. O poeta abandona o eufemismo e o romantismo jocoso das classes superiores da sociedade, mas também parece ter se distanciado das classes médias. Escreve suas tragédias para o grande e heterogêneo público dos teatros londrinos, sem levar em conta esta ou aquela classe em particular. Mesmo as chamadas comédias desse período estão repletas de melancolia.


Segue-se então uma quarta e última fase no desenvolvimento do poeta: um tempo de resignação e suave tranqüilidade com tragicomédias que uma vez mais refletem um certo estado de ânimo romântico. Shakespeare deixa a classe média, que dia a dia se torna mais míope, mais tacanha e intolerante, em seu puritanismo, cada vez mais atrasada e distante. Os ataques das autoridades civis e eclesiásticas contra o teatro aumentam; e os atores e dramaturgos contam uma vez mais com seus mecenas e protetores nos círculos da corte e na nobreza e adaptam-se mais aos gostos deles. Shakespeare volta a escrever peças em que predominam os elementos romântico-fabulosos e que são, em muitos aspectos, reminiscência dos espetáculos e "máscara de corte".


Três anos antes de morrer, no auge de seu desenvolvimento, Shakespeare retira-se do teatro e pára inteiramente de escrever peças, não se sabe muito bem por quê. Se Shakespeare deixou o teatro saturado ou desgostoso, uma coisa é certa, durante a maior parte de sua carreira teatral, ele se manteve numa relação muito positiva com seu público, embora favorecesse diferentes segmentos deste durante as várias fases de seu desenvolvimento e acabasse não sendo capaz de identificar-se completamente com qualquer deles, em todo o caso Shakespeare foi o primeiro, se não o único grande poeta em toda a história do teatro, a atrair e a receber plena aprovação de um público numeroso e heterogêneo que abrangia quase todos os níveis da sociedade.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Tirso de Molina


Frei Gabriel de Tellez é o nome verdadeiro do dramaturgo espanhol Tirso de Molina, homem pleno de “talento e infortúnios”, segundo ele mesmo disse em uma de suas obras. Vastíssima foi sua produção literária, iniciada em 1606. No entanto, muito do que fala a respeito de sua vida e obra não são de todo verdade. É possível que fosse “filho natural” do duque de Osuna. Nada se sabe ao certo, embora chame atenção à maneira com que trata a leviana conduta das pessoas da alta sociedade daquela época. Não obstante, cabe destacar que gozou de esmerada educação, estudou na Universidade de Alcalá e, com certa amargura, tornado teólogo de renome.

Em 1600, suas inclinações religiosas o enviaram como noviço com 30 anos de idade, ao convento da ordem de Mercedes de Guadalajara, local onde, um ano mais tarde professaria seus votos solenes. Passou por vários conventos até que em 1616, quando se encontra em Sevilla, embarca para a ilha de Santo Domingo, onde se aprofunda em Teologia.

De volta à Espanha, com um amplo acervo de memórias coletadas em suas viagens, afirma ele: “não merece o nome de homem quem permanece encerrado em seu país e ignora as demais gentes”. Tirso viajava muito pelo interior da Espanha e tinha convívio com gente de relevada importância; foi muito amigo de Lope de Vega, a quem conheceu na Academia Poética fundada pelo humanista Juan Francisco de Medrano. De Lope dirá em alguma ocasião “…tem elevado a comédia a tal ponto de perfeição e sutileza que pode formar escola por si só; e todos nós, que nos consideramos seus discípulos, teremos que defender sua doutrina contra seus adversários entusiásticos”.

A ele são atribuídas aproximadamente 400 obras e sabe-se de algumas outras perdidas, porém grande parte de seu material foi salvo e constituem um dos tripés gloriosos do teatro de ouro espanhol, junto com ‘o monstro’ Lope e o “imortal” Calderón.

Por causa da publicação de seu renomado livro “misceláneo Cigarrales de Toled” (1621) que inclui prosa, verso e teatro, uma comissão de examinadores da Inquisição o exilou da Corte, por volta de 1626, por atentar contra a moral cristã. Molina imprimiu caráter religioso às suas obras, uma mescla de histórias piedosas, poesia devota e autos sacramentais; sua aparição, em 1635, anos mais tarde de que fora nomeado cronista oficial da Ordem a qual, três anos depois dedicou a “História geral da Ordem de Mercedes”. Apesar destes trabalhos, recebeu novas críticas que lhe valeram novos desterros. Embora tenha vivido seus últimos anos de vida em Soria (como prior) e em Almazán, sua glória se deve a seu talento e fecundidade da obra.

No teatro dominou a “intriga” com uma estrutura cuidadosa e, segundo os eruditos, criou uma ponte entre a comédia Lopesca e o intrincado desenvolvimento que alcançaria Calderón de la Barca. Sua inspiração toma atitudes variadas, com personagens talentosos e maníacos, impulsivos ou hipócritas, sem médias tintas. Entre seus trabalhos, chama a atenção uma obra em prosa, derivada do Decamerón e as novelas (tipo italiano) que agrupam várias histórias narradas por damas e cavalheiros.

Trata-se de um poema dramático e intenso e comovente destinado a apartar os seculares dos mistérios de preocupação mórbida por uns mistérios impenetráveis, orientando para a prática de um cristianismo sadio. É, acima de tudo, uma obra sobre a vida e a morte do ponto de vista da prática religiosa.“El condenado por desconfiado” tem tanto, os protagonistas, quanto, intrigas entrelaçadas de igual importância temática e tende a provocar a reflexão sobre a natureza da verdadeira devoção.

Dentre suas quatrocentas comédias destacam cerca de sessenta publicadas entre 1627 e 1636, algumas das quais mencionaremos: (cenários históricos) La prudencia de la mujer”, “Las quinas de Portugal” (hagiografia (vida dos santos)), “La venganza de Tamar “(sobre os amores incestuosos de Ammón, primogênito do Rei David, e sua hermanastra Tamar), “La espigadera”, “Santa Juana”. Inúmeros assuntos são dedicados ao teatro de Tirso, inclusive os costumes relaxados de seus contemporâneos, donde encontramos sigilosos agravos acerca da duvidosa origem de frei Gabriel Téllez.

Demonstram particular interesse às comédias de enredos, as que cabe mencionar: “El vergonzoso en palácio” (um pastor, Mireno, sente um desejo instintivo de levar uma vida nobre e devido a um infortúnio é preso quando leva as roupas do secretário de um duque. No palácio ducal diz chamar-se Don Dionís, e a filha do duque, que se enamora dele, convence o pai para que lhe devolva a liberdade em nome do secretário. Com diversos ardis, a filha do duque consegue persuadir o jovem por quem está apaixonada. Tudo acaba bem. A protagonista declara-se astutamente em sonhos a seu tímido galã).

Muitos são os temas e todos delineados com engenho por Tirso de Molina, mas teremos que deter-nos no “El burlador de Sevilla”, donde se combinam elementos do drama religioso, da comédia de capa e espada e (novamente) as sátiras de costumes relativos às classes elevadas. Tudo nos leva à figura de Don Juan, cujo desordenado erotismo o confronta moralmente com a sociedade, fazendo-lhe digno do castigo divino. Assim, “El burlador de Sevilla” é a principal fonte de uma tradição literária internacional: a do mito de Don Juan, a que pertencem numerosas obras de grande vulto, a miúde muito diferentes, desde a Espanha do século XVII até a Inglaterra.

Com efeito, “El burlador de Sevilla (O trapaceiro de Sevilla)” não foi a primeira obra que foi escrita sobre Don Juan. “El burlador” foi impresso no século XVII como obra de Tirso, mas é de assombrar-se que não figura em nenhum dos livros que o mesmo publicou.Assim mesmo, fala-se de semelhanças com outra obra atribuída a Calderón, mas a maior parte dos entendidos convencionam de que tem o brilho e a eloqüência de Tirso.

O Que é El burlador de Sevilla? Arrogante e desinibido, Don Juan Tenorio surpreende a diversas mulheres com enganos e astúcias covardes.É filho privado do rei de Espanha e sobrinho do embaixador espanhol em Nápoles e também trapaceiro, arrogante e nécio. Seduz as damas, engana-as com falsas promessas de matrimônio; no caso de Dona Ana de Ulloa, escondido, mata o pai dela, Don Gonzalo, e passado um tempo, quando visita a tumba deste, tira-lhe a barba e convida-o a jantar em sua companhia. A estátua aparece e intima-o, e a seu término convida-o a sua vez a jantar na capela. Don Juan foge para a igreja donde está sepultado Don Gonzalo e traz uma comida composta de escorpiões, víboras e fel, a estátua toma a mão de Don Juan e ambos se aprofundam no inferno. O rei de Espanha coloca ‘ordem’ na sociedade casando as vítimas de Don Juan com pares adequados. Tem-se falado que El burlador é um drama em que a edificação da sociedade humana se mostra débil e suja. Wilson a considera uma grandiosa e impressionante tragédia social.

Finalmente, o êxito da versão de Don Juan Tenorio, de Zorrilla, tem imortalizado a personagem em todo o mundo.A incansável “pena” de Tirso penetra, temerária na ligeireza da vida monástica (que deve ter produzido alguns dissabores) em “La elección por la virtud”, composta em 1622. Por esses tempos teve severas críticas da Igreja em que nosso dramaturgo escapou por sorte.
Nessa época nosso inspirado escritor dá a luz a uma obra talentosa, divertida e intencionada: “Don Gil de las calzas verdes”. Escreveu também, “La prudencia en la mujer”, drama histórico centrado nas figuras de Fernando IV, “el Emplazado, y la reina madre, dona María de Molina”; houve algumas habituais que saborearam os ‘currais’ de Madrid como: “Los balcones de Madrid”; “Bellaco sois, Gómez”; “El honroso atrevimiento”;”El celoso prudente” e alguns autos sacramentais para estar de bem com a Igreja.

Sua obra esteve relegada à segundo plano, considerada como "menor" que a de Um Calderon, ou de um Lope de Vega, mas parece que o século XIX começou a desfazer esse "mal-entendido". Sua obra ressurge, graças aos estudos de Dionisio Solís, Agustín Durán e Juan Eugenio Hartzembusch.

Tirso, com Lope e Calderón, representa, com Cervantes à frente, o melhor que o "Século do Ouro Espanhol", ofertou a cultura européia. Obras como “El vergonzoso en Palácio”, “La villana de Vallecas” e sobretudo a diabólica presença de Don Juan, asseguraram a permanência de Frei Téllez, e asseguraram um Tirso com talento e humildade, mas também com talento e penetração, imortal nos costumes de um povo que asseguraram ao dramaturgo permanência na cabeceira do melhor teatro castellano.

Gil Vicente


Gil Vicente é geralmente considerado o primeiro grande dramaturgo português, além de poeta de renome. Há quem o identifique com o ourives, autor da célebre “custódia de Belém”, mestre da balança, e mestre da retórica do rei Dom Manuel. Enquanto homem de teatro, parece ter também desempenhado as tarefas de músico, ator e encenador. É frequentemente considerado o pai do teatro português, ou mesmo do teatro ibérico já que também escreveu em castelhano - partilhando a paternidade da dramaturgia espanhola com Juan Del Encina.

A obra vicentina é tida como reflexo da mudança dos tempos e da passagem da Idade Média para o Renascimento, fazendo-se o balanço de uma época onde as hierarquias e a ordem social eram regidas por regras inflexíveis, para uma nova sociedade, onde se começa a subverter a ordem instituída. Foi, o principal representante da literatura pré-renascentista portuguesa, anterior a Camões, incorporando elementos populares na sua escrita que influenciou, por sua vez, a cultura popular portuguesa.

Guimarães é um dos locais que reclama ser o berço do dramaturgo, assim como também reivindicam seu nascimento as cidades de Lisboa e a Beira Baixa.
Apesar de se considerar que a data mais provável para o seu nascimento tenha sido em 1466, há quem proponha as datas de 1460, ou ainda entre 1470 e 1475. Se nos basearmos nas informações veiculadas na própria obra do autor, encontraremos contradições. O Velho da Horta, a Floresta de Enganos ou o Auto da Festa, indicam 1452, 1470 e antes de 1467, respectivamente. Desde 1965, quando decorreram festividades oficiais comemorativas do 500º do nascimento do dramaturgo, que se aceita 1465 de forma quase unânime.
Gil Vicente era ourives quando escreveu a sua primeira obra, uma imitação do Auto del Repelón, de Juan Del Encina a quem pede emprestada não só a história, mas também as personagens com o seu respectivo idioma, o saiaguês.
Apesar das muitas controvésias a respeito de sua data de nascimento, de sua origem e se era ourives ou não, sabe-se, ao menos que casou-se com Branca Bezerra, de quem nasceram Gaspar Vicente(que morreu em 1519) e Belchior Vicente(nascido em 1505). Com a morte de Branca, casou novamente com Melícia Rodrigues, de quem teve Paula Vicente (1519-1576), Luís Vicente (que organizou a compilação das suas obras junto com a irmã Paula) e Valéria Borges. Presume-se também que Gil Vicente tenha estudado em Salamanca.

O seu primeiro trabalho conhecido, a peça Auto da Visitação, também conhecido como Monólogo do Vaqueiro, foi representada nos aposentos da rainha D. Maria I, consorte de Dom Manuel, para celebrar o nascimento do príncipe (o futuro Dom João III) - sendo esta representação considerada como o marco de partida da história do teatro português, acontecimento que se deu na noite de 8 de junho de 1502, com a presença do rei, da rainha, de Dona Leonor, viúva de Dom João II e Dona Beatriz, mãe do rei. Um dos raros casos na história em que se uma data para a fundação de um “Teatro”.

Gil Vicente tornou-se, a partir de então, responsável pela organização dos eventos palacianos. Dona Leonor pediu ao dramaturgo a repetição da peça pelas matinas de Natal, mas o autor, considerando que a ocasião pedia outro tratamento, escreveu o Auto Pastoril Castelhano. A encenação incluía um ofertório de prendas simples e rústicas, como queijos, ao futuro rei, ao qual se pressagiavam grandes feitos. Dona Leonor se tornou sua grande protetora.

Se foi realmente ourives, terminou a sua obra-prima nesta arte - a Custódia de Belém - feita para o Mosteiro dos Jerónimos, em 1506, produzida com o primeiro ouro vindo de Moçambique. Três anos depois, tornou-se vedor do patrimônio de ourivesaria do Convento de Cristo, em Tomar, Nossa Senhora de Belém e no Hospital de Todos-os-Santos, em Lisboa. Em 1511 é nomeado vassalo de el-Rei e, um ano depois, representante da bandeira dos ourives na "Casa dos Vinte e Quatro". Em 1513, o mestre da balança da Casa da Moeda, Gil Vicente, foi eleito vereador de Lisboa. Será ele que dirigirá os festejos em honra de Dona Leonor, a terceira mulher de Dom Manuel, em 1520, um ano antes de passar a servir Dom João III, conseguindo o prestígio do qual se valeria para se permitir a satirizar o Clero e a Nobreza nas suas obras ou mesmo para se dirigir ao monarca criticando suas ações. Como o fez em 1531, por ntermédio de uma carta ao Rei onde defende os cristãos-novos.

Gil Vicente morreu em lugar desconhecido, talvez em 1536, porque é a partir desta data que se deixa de encontrar qualquer referência ao seu nome nos documentos da época, além de ter deixado também de escrever a partir desta data.

É evidente que o teatro português não nasceu com Gil Vicente. Esse mito, criado por vários autores, sobretudo por seu próprio filho, Luís Vicente, por ocasião da primeira edição da "Compilação" da obra completa do pai, poderá justificar-se pela importância inegável do autor no contexto literário da península ibérica, mas não é de todo verdadeiro já que existiam manifestações teatrais antes da noite de 8 de junho de 1502.

Os dois atores mais antigos portugueses são, Bonamis e Acompaniado, que, durante o reinado de Sancho I, realizavam um espetáculo de "arremedilho", tendo sido pagos pelo rei com uma doação de terras. O arcebispo de Braga, Dom Frei Telo, refere-se, num documento de 1281, a representações litúrgicas por ocasião das principais festividades católicas. Em 1451, o casamento da infanta Dona Leonor com o imperador Frederico III, da Alemanha foi acompanhado também de representações teatrais. Também nas cortes de Dom João I, Dom Afonso V e Dom João II, se faziam encenações. Contudo, pouco resta dos textos dramáticos pré-vicentinos. Além das éclogas dialogadas de Bernardim Ribeiro, Cristóvão Falcão e Sá de Miranda, André Dias publicou em 1435 um "Pranto de Santa Maria", considerado um esboço razoável de um drama litúrgico.

A obra de Gil Vicente vem no seguimento do teatro ibérico popular e religioso que já se fazia. Os temas pastoris, presentes na escrita de Juan del Encina vão influenciar fortemente a sua primeira fase de produção teatral e permanecerão esporadicamente na sua obra posterior, de maior diversidade temática e sofistificação. De fato, a sua obra tem uma vasta diversidade de formas: o auto pastoril, a alegoria religiosa, narrativas bíblicas, farsas episódicas e autos narrativos.

Gil Vicente retratou, com refinada comicidade, a sociedade portuguesa da priemeira metade do século XVI, demonstrando grande capacidade de observação ao traçar o perfil psicológico das suas personagens. Crítico severo dos costumes, de acordo com a máxima que seria ditada por Moliere ("Ridendo castigat mores" - rindo se castigam os costumes), Vicente é também um dos mais importantes autores satíricos da língua portuguesa. Em 44 peças, o autor usa grande quantidade de personagens extraídos do espectro social português. É comum a presença de marinheiros, ciganos, camponeses, fadas e demônios e de referências a dialetos e linguagens populares.

Suas obras-primas são, além da trilogia de sátiras Auto da Barca do Inférno(1516), Auto do Purgatório (1518) e Auto da Barca da Glória (1519). Em 1523 escreve a Farsa de Inês Pereira.

São geralmente apontados, como aspectos positivos das suas peças, a imaginação e originalidade evidenciadas; o sentido dramático e o conhecimento dos aspectos relacionados com a problemática do teatro.
Alguns autores consideram que a sua espontaneidade perde em reflexão e requinte. De fato, sua forma de exprimir é simples e direta, sem grandes floreados poéticos. Ma acima de tudo, o autor exprime-se de forma inspirada, nem sempre obedecendo a princípios estéticos e artísticos do mais puro equilíbrio. É versátil nas suas manifestações: se, por um lado, parece ser uma alma rebelde, temerária, impiedosa no que se esforça em demonstrar os vícios dos outros, tal qual um bobo da Côrte, por outro lado, mostra-se dócil, humano e terno na sua poesia religiosa e quando se trata de defender aqueles a quem a sociedade maltrata.

- O seu lirismo religioso, de raiz medieval está bem presente, por exemplo, no Auto de Mofina Mendes, na cena da Anunciação, ou numa oração dita por Santo Agostinho, no Auto da Alma.
- O seu lirismo patriótico presente em Exortação da Guerra, Auto da fama ou Cortes de Júpiter, não se limita a glorificar, em estilo épico e orgulhoso, a nacionalidade: é crítico e eticamente preocupado, principalmente no que diz respeito aos vícios nascidos da nova realidade econômica, decorrente do comércio com o Oriente. Tema presente em Auto da Índia.
- O seu lirismo amoroso, por outro lado, consegue aliar algum erotismo e alguma brejeirice com influências mais eruditas, como Petrarca, por exemplo.

A obra de Gil Vicente transmite uma visão do mundo que se assemelha e se posiciona como uma perspectiva pessoal do PLatonismo: existem dois mundos - o Mundo Primeiro, da serenidade e do amor divino, que leva à paz interior, ao sossego e a uma "resplandecente glória", como dá conta sua carta a D. João III; e o Mundo Segundo, aquele que retrata nas suas farsas: um mundo "todo ele falso", cheio de "canseiras", de desordem sem remédio, "sem firmeza certa". Estes dois mundos refletem-se em temas diversos da sua obra: por um lado, o mundo dos defeitos humanos e das caricaturas, servidos sem grande preocupação de verossimilhança ou de rigor histórico. Por outro lado, valoriza os elementos míticos e simbólicos do Natal: a figura da Virgem Mãe, do Deus Menino, da noite natalina, demonstrando aí um zelo lírico e uma vontade de harmonia e de pureza artística que não existe nas suas mais conhecidas obras de crítica social.

Há um forte contraste nos elementos cênicos usados por Gil Vicente: a luz contra a sombra, não numa luta feroz, mas em convivência quase amigável. A noite de natal torna-se também aqui a imagem perfeita que resume a concepção cósmica de Gil Vicente: as grandes trevas emolduram a glória divina da maternidade, do nascimento, do perdão, da serenidade e da boa vontade.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

FRÍNICO


FRÍNICO DE ATENAS

Frínico viveu entre os séculos VI e V a.C., e é considerado um dos criadores da tragédia. Foi o maior poeta trágico anterior a Ésquilo. Atribui-se a ele a introduçaõ de personagens femininos na tragédia, de máscaras e de uma estrutura poética baseada em um trímetro iâmbico. Em Shakespeare, por exemplo se usa o pentâmetro iâmbico, que vem a ser uma divisão silábica fonética, com divisão frasal em cinco sílabas tônicas.

De suas obras só nos chegaram alguns titulos e pequenos fragmentos de:
Os egípcios, As Danáides, Alcestes, As Fenícias e A tomada de Mileto (peça que narra um acontecimento real: a queda da cidade de Mileto, durante as Guerras Médicas, para os Persas), peça que causou grande comoção em Atenas na época em que se representou.
Frínico de Atenas foi discípulo de Téspis e ampliou a função do “respondedor” (hypokrites) do coro, investindo-o de um duplo papel e fazendo-o aparecer com uma máscara masculina e uma feminina, alternadamente. Isso significava que o ator devia fazer várias entradas e saídas, e a troca de figurino e de máscara sublinhava uma organização cênica introduzida no decorrer dos cânticos. Um outro passo à frente foi dado, seguindo da declamação para a “ação”.

SÓFOCLES


SÓFOCLES

Sófocles era um admirador de Fídias que, na mesma época, criava em mármore, bronze e marfim a imagem do homem semelhante aos deuses. Da mesma forma que Fídias deu uma alma à estatuária arcaica, Sófocles deu alma às suas personagens. Ele pôs em cena personalidades que se atreveram a – como a pequena Antígona, cuja figura cresce por força das obrigações assumidas por vontade própria. – a desafiar o ditame dos mais fortes: “não vim para encontrar-vos no ódio, mas no amor”.
Os deuses submetem o rebelde ao sofrimento sem saída. O homem tem consciência dessa ameaça, mas por suas ações força os deuses a ir até os extremos. Para o homem de Sófocles, o sofrimento é a dura, mas enobrecedora escola do “Conhece-te a ti mesmo”, por suas próprias mãos.
Sófocles dá aos deuses a vitória, o triunfo integral, porque sofre o destino terrestre sobre todos os abismos do ódio, arrebatamento, vingança, violência e sacrifício. O significado do sofrimento reside em sua aparente falta de significado. “Pois em tudo isso não existe nada que não venha de Zeus”. - Diz ele ao final de As Traquínias.
Foi da natureza inalterável do conceito de destino sofocliano que Aristóteles derivou a sua famosa definição de tragédia cuja interpretação tem sido debatida ao longo dos séculos, que o crítico e dramaturgo alemão Lessing entende como “a purificação das paixões pelo medo e pela compaixão”. Ao passo, que atualmente também é interpretado como “o alívio prazeroso do horror e da aflição”.
A tragédia comove profundamente o coração. Já que o faz transcender até o prazer catártico de uma libertação que alivia. Tendo a sua essência inteiramente orientada para outro objetivo, a tragédia logra, por isso mesmo, atingir por comoção o âmago de uma pessoa, que poderá sair transformada deste contato.

ÉSQUILO


ÉSQUILO

É com Ésquilo que a tragédia grega antiga chega à perfeição artística e formal, que permaneceria um padrão para todo o futuro. Em 490 a.C., Ésquilo participou da “Batalha de Maratona”, e foi um dos que abraçaram apaixonadamente a idéia da democracia.Ésquilo ganhou os louros da vitória na “agon teatral” somente após diversas tentativas, quando Os Persas foi encenada pela primeira vez. De acordo com cronistas antigos, Ésquilo escreveu noventa tragédias. Destas, conservaram-se, apenas sete. Em Os Persas, Ésquilo dedicou-se a um tema local. Sabe-se, que a trilogia de Os Persas seguia-se à peça satírica Prometeu, Portador do Fogo.
Os componentes dramáticos da tragédia arcaica compunham-se do prólogo, que explicava a história prévia; o cântico de entrada do coro; o relato dos mensageiros na trágica virada do destino, e o lamento das vítimas. Ésquilo seguia essa estrutura. A princípio, ele antepunha ao coro dois atores e, mais tarde, como Sófocles, três.
O pano de fundo de Os Persas é a glorificação da jovem cidade-estado de Atenas, tal como é vista da corte real da Pérsia, derrotada em Salamina. Quando Atossa pergunta ao corifeu: “Quem rege os gregos? Quem os governa?” A resposta expressa o orgulho do autor pela polis ateniense: “Eles não são escravos, não tem senhor”.
O que Atossa, Antígona, Orestes ou Prometeu sofrem não é um destino individual. Em Ésquilo, sua sorte representa uma situação excepcional, o conflito entre o poder dos deuses e a vontade humana. A impotência do homem contra os deuses, amplificada em um acontecimento monstruoso. Isso irrompe em sua força mais elementar em Prometeu Acorrentado. O grito de tormento preferido pelo Prometeu de Ésquilo ergue-se acima das forças primordiais da antiga religião da natureza: “A mim que me apiedei dos mortais, não me foi mostrada nenhuma piedade”.
Quatro anos depois de ter ganhado o prêmio com Os Persas, Ésquilo enfrentou pela primeira vez, no concurso anual de tragédias, um rival à altura, Sófocles, então com vinte e nove anos, filho de uma rica família ateniense, que, ainda menino, liderara o coro de jovens nas celebrações da vitória após a batalha de Salamina.

EURÍPIDES

EURÍPIDES
Com Eurípides teve início o teatro psicológico do Ocidente. “Eu represento os homens como devem ser”. - Eurípides os representa como eles são. Sófocles disse uma vez.O terceiro dos grandes poetas trágicos da antiguidade, partiu de um nível inteiramente novo de conflito.

- Ésquilo via heroísmo trágico como um engano que condenava a si mesmo pelos próprios excessos;
- Sófocles havia sobreposto o destino divino à disposição humana para o sofrimento;
- Eurípides rebaixou a providencia divina ao poder cego do acaso.
Eurípides, filho de um proprietário de terras, nasceu em Salamina e foi instruído pelos sofistas atenienses. Era um cético que duvidava da existência da verdade absoluta. E como tal, se opunha a qualquer idealismo paliativo. Estava interessado nas contradições e ambigüidades; o pronunciamento divino não era verdade absoluta para ele e não lhe oferecia nenhuma solução conciliatória final.
Em contradição com a doutrina socrática em que o conhecimento é expresso diretamente na ação, Eurípides concede às suas personagens o direito de hesitar. Graças a essa minuciosa exploração dos pontos fracos na tradição mitológica, acusaram-no de ateísmo e da perversão sofista dos conceitos morais e éticos. De suas setenta e oito tragédias, restam dezessete e uma sátira. Eurípides morreu em Pela, em março do ano de 406a.C. Quando a notícia chegou a Sófocles, em Atenas, ele vestiu luto e fez com que o coro se apresentasse sem as costumeiras coroas de flores na grande Dionisíaca, então, em plena atividade. Poucos meses mais tarde, Sófocles também morreu. Agora o trono dos grandes poetas trágicos estava vazio.
A comédia As Rãs, de Aristófanes, escrita nesse período, pode ter funcionado como as exéquias (cerimônias fúnebres) da tragédia Ática. Em As Rãs, Aristófanes presta testemunho das tensões artísticas e políticas do final do século V, dos conflitos internos da polis fragmentada e do reconhecimento de que o período clássico da arte da tragédia havia se convertido em história.
Nesta peça, Dioniso, o deus do teatro avaliará os méritos de Ésquilo e Eurípides, mas ele se revela indeciso, vacilante e suscetível quanto à escolha de quem é o pai da tragédia. Visto no espelho grosseiro e distorcido da comédia, o deus, de má vontade, força-se a tomar uma decisão.
A era de ouro da tragédia antiga estava irrevogavelmente acabada. A arte da tragédia desintegrou-se, assim como o modo de vida das cidades-estado e o poder unificador da cultura clássica grega. O espírito da tragédia e a democracia ateniense haviam perecido juntos.

As grandes dionisíacas

AS GRANDES DIONISÍACAS

Com origem na época de Péricles, as Grandes Dionisíacas ou Dionisíacas Urbanas. Constituíam um ponto culminante e festivo na vida religiosa, intelectual e artística da cidade-estado de Atenas. Eram festividades que duravam seis dias.
Os preparativos dos concursos dramáticos eram responsabilidade do arconte, que, na condição de mais alto oficial do Estado, decidia, tanto as questões artísticas, quanto as organizacionais. As tragédias inscritas no concurso eram submetidas a ele, que selecionava três tetralogias que competiriam no agon. Finalmente o arconte, indicava a cada poeta um corega, algum cidadão ateniense rico que pudesse financiar um espetáculo, cobrindo, não apenas os custos de ensaiar e vestir o coro, mas também os honorários do diretor do coro (corus didascalus) e os custos com a manutenção de todos os envolvidos.
Ter ajudado alguma tetralogia trágica era um dos mais altos méritos que um homem poderia conseguir na sociedade ateniense. O prêmio concedido era uma coroa de louros e uma quantia em dinheiro. (como compensação pelos gastos anteriores) e a imortalidade nos arquivos do Estado. Esses registros – chamados de didascalias, que o arconte mandava preparar após cada agon dramático, representam a documentação mais valiosa de uma glória, da qual apenas poucos raios recaíram sobre nós.
Ao entrar no auditório cada espectador recebia um pequeno ingresso de metal (symbolon), com o número do assento gravado. Não precisava pagar nada. Nas fileiras mais baixas, logo à frente, lugares de honra (proedria) esperavam o sacerdote de Dioniso, as autoridades e convidados especiais, os juízes, os coregas e os autores; uma seção separada era reservada aos homens jovens (efebos), e; as mulheres sentavam-se nas fileiras mais acima.
Vestido com o branco ritual, o público chegava em grande número às primeiras horas da manhã e começava a ocupar as fileiras semicirculares. Curioso da democracia ateniense é que ao lado dos cidadãos livres também era permitida a presença de escravos. A aprovação da peça era indicada por estrepitosas salvas de palmas, e o desagrado, por batidas com os pés ou assobios. A liberdade de expressar sua opinião foi algo de que o antigo freqüentador de teatro fez uso amplo e irrestrito.
A condição necessária para essa experiência comunitária era a magnífica acústica do teatro ao ar livre da antiguidade. Por sua vez, a máscara, geralmente feita de linho revestido de estuque, prensada em moldes de terracota, amplificava o poder da voz, conferindo, tanto ao rosto, como às palavras, um efeito amplificador. O coro participava dos acontecimentos como comentador, informante, conselheiro e observador.
Aristóteles credita a Sófocles a invenção do cenário pintado. Ao lado das possibilidades de “mascarar” a skene e de introduzir acessórios móveis como os carros para exposição e batalha, os cenógrafos tinham à sua disposição os chamados “degraus de Caronte” uma escadaria subterrânea que levava a skene, facilitando as aparições vindas do mundo inferior. Uma troca de máscara e figurino dava aos três locutores individuais a possibilidade de interpretar vários papéis na mesma peça.
Foi Ésquilo quem introduziu as máscaras de planos largos e solenes. A impressão heróica era intensificada. O traje do ator trágico consistia geralmente no quíton – uma túnica jônica ou dórica, usada na Grécia antiga – um manto, e o característico cothurnus, uma bota alta de uns quarenta centímetros provavelmente, com cadarço e sola grossa.
Com Sófocles a qualidade arcaica e linear da máscara começou a suavizar-se; os olhos e a boca, bem como, a cor e a estrutura da peruca eram usadas para indicar a idade e o tipo da personagem representada gerando uma maior individualização das máscaras.
Eurípides exigia contrastes impactantes entre vestimentas e ambientes. “Seus reis andam em farrapos” apenas para tocar a corda sensível do povo, zombava Aristófanes, seu implacável adversário. O que parecia particularmente ridículo para Aristófanes e entrava como risonha paródia em suas comédias era a predileção de Eurípides por um expediente do teatro antigo que se tornou parte do vocabulário em todo o mundo ocidental, o deus ex-machina, ou o deus descido da máquina.
DEUS EX-MACHINA: Essa “máquina voadora” era um elemento cênico de surpresa, um dispositivo mecânico que vinha em auxílio do poeta quando este precisava resolver um conflito humano aparentemente insolúvel, por intermédio do pronunciamento divino “vindo de cima”. Mecanicamente, consistia em um guindaste que fazia descer uma cesta do teto do teatro. Nesta cesta, sentava-se o deus ou o herói, cuja ordem fazia com que a ação dramática voltasse a correr pelas trilhas mitológicas obrigatórias quando ficava emperrada. Nas personagens euripidianas as personagens agem com determinação individual e, dessa forma, transgridem os limites traçados por uma mitologia que não mais podia ser aceita sem questionamento. Electra, Antígona, e Medeia seguem o comando de seu próprio ódio e amor. E toda essa voluntariosa paixão é, ao final, domada pelo deus ex-machina.
ECICLEMA: Outro dispositivo cênico essencial para a tragédia, entrou em ação nesta época: o eciclema. Tratava-se de uma pequena plataforma rolante, quase sempre elevada, sobre a qual um cenário era movido desde as portas de uma casa ou palácio. O eciclema traz à vista todas as atrocidades que foram perpetradas por trás da cena: o assassinato de uma mãe, irmã ou criança. Exibe sangue, terror e o desespero de um mundo despedaçado.Eventualmente, o teto da própria skene era usado, como, naturalmente, eram os deuses que, em geral apareciam em alturas etéreas, essa plataforma no teto tornou-se conhecida na Grécia como theologeion: o lugar de onde os deuses falam.
O “deus ex-machina”, o eciclema e o theologeion pressupunham um edifício teatral firmemente construído, como o que se desenvolveu em Atenas no final do século V a.C. O projeto da skene, de Péricles proveu um palco monumental com duas grandes portas laterais, ou paraskenia. Deve ter sido executado entre 420 e 400 a.C., na época em que o auditório cresceu e a orquestra diminuiu de tamanho. A razão para esta mudança foi o deslocamento intencional da ação da orchestra para a skene. Essa inovação mostrou se justificar posteriormente, quando o coro, situado na orchestra, foi gradativamente reduzido no curso das medidas econômicas atenienses e, por fim, desapareceu completamente por cerca do final do século IV a.C.

Nenhum dos três grandes trágicos, nem Aristófanes viveram para ver esse novo edifício teatral acabado. Entre 338 a.C. e 336 a.C., durante a segunda metade do século IV a.C., quando Licurgo foi encarregado das finanças de Atenas, a nova e magnífica estrutura finalmente ficou pronta. Mas nessa época a grande e criativa ERA DA TRAGÉDIA ANTIGA já havia se tornado parte da História.

sábado, 11 de abril de 2009

Alexandre Dumas Filho

Alexandre Dumas Filho

Nasceu em Paris ( 27 de julho de 1924- 27 de novembro de 1895), França, filho ilegitimo de Marie Catherine Labay, uma costureira, e do romancista Alexandre Dumas. Em 1831, seu pai o reconheceu legalmente e assegurou uma boa educação ao jovem Dumas, na instituição Goubaux e no Colégio Bourbon. As leis daquela época permitiram Dumas pai tirar seu filho de sua mãe. A agonia de sua mãe inspirou o filho a escrever sobre personagens trágicos femininos. Em quase todos os seus escritos, ele enfatizou o propósito moral de sua literatura e em sua peça de 1858, “O Filho Natural”, ele expõe a teoria de que se alguém traz ilegitimamente um filho ao mundo, então ele tem a obrigação de legitimar seu filho e casar com a mulher. Além do estigma da ilegitimidade. Dumas filho, sofria com o preconceito por possuir descendência negra seu avô era descendente de um nobre francês e uma mulher negra haitiana. Esses acontecimentos influenciaram profundamente seus pensamentos, comportamento e obra.
Em 1844, Dumas Filho, mudou-se para Saint Germain em Laye para viver com seu pai, ele conheceu Marie Duplessi, uma jovem cortesã que lhe deu a inspiração para o romance ‘La dame aus camélias ( A Dama das Camélias).
A Dama das Camélias é a base para ópera La Traviata de Giuseppe Verdi.
Em 1864, Alexandre Dumas Filho casou-se com Nadeja Naryschkine, com quem ele teve uma filha. Após o falecimento dela, ela casou-se com Heriette Régnier.
Durante sua vida Dumas Filho, escreveu outros doze romances e diversas peças. Em 1867 ele publicou seu semi autobiográfico romance, “L’affaire Clemenceau’, considerado por muitos como uma de suas melhores obras. Em 1874, ele foi admitido na Academia française e em 1894 ele ganhou a ‘Légion d’Honneur’.
Alexandre Dumas Filho,,morreu em Marly de Roi, em Yvelines, em 27 de novembro de 1895 e foi enterrado no cemitério de Montmartre, Paris, França.

Obras notáveis

Livros

. A Dama das Camélias
. L’affaire Clemenceau

Operas

. A ópera La Traviata de Verdi foi baseada no romance: A Dama das Camélias

Peças

. O Filho Natural

Cronologia

1824 – Em 27 de julho, nasceu em Paris Alexandre Dumas, filho natural do escritor Alexandre Dumas
1831 - Seu pai o reconhece legalmente como filho e reivindica sua guarda na justiça
1840 - Manda imprimir uma coletânea de versos de sua autoria, intitulada Pecados da Minha Juventude.
1842 – Viaja à Itália em companhia do pai
1844 - O pai se separa da esposa, e Alexandre Dumas passa a morar com ele. Apaixona-se pela cortesã Marie Duplessis.
1845 - Parte com o pai em uma viagem à Espanha e à África.
1847 - Escreve As aventuras de Quatro Mulheres e um Papagaio. Recebe a notícia da morte de Marie Duplessis. É publicado o romance: A Dama das Camélias.
1850 - Escreve o romance Tristan Le Roux.
1852 - A Dama das Camélias é encenada no palco pela primeira vez.inicia um relacionamento com Nadine ( Nadja Naryschkine).
1853 - Publica Diane de Lys. Giuseppe Verdi apresenta em Veneza a ópera LaTraviata, baseada em A Dama das Camélias.
1855 - Publica Le Demi Monde
1857 - Em maio nasce a filha Jeanine. Publica a Questão do Dinheiro.
1858 - Publica O Filho Natural.
1859 - Publica Um Pai Prodigo
1860 - Em novembro nasce a segunda filha, Colette
1864 - Nadine fica viúva. Dumas e ela se casam. Dumas reconhece publicamente a paternidade das duas filhas de seu relacionamento com Nadine.
1867 - Escreve As Idéias de Mme Aubray e o romance semi autobiográfico I’Affaire Clémenceau
1874 - Ingressa na Academia Francesa de Letras
1876 - Pública A Estrangeira
1885 - Escreve Denise
1894 - É condecorado pela Legião de Honra
1895 - More Nadine,sua esposa. Dumas casa-se com Henriette Régnier, 27 anos mais nova que ele. Morre em 27 de novembro, em Marly Le Roy

Contexto Histórico

Todos os aspectos característicos do século já são reconhecíveis por volta de 1830, A burguesia está na plena posse de seu poder e tem absoluta consciência disso. A aristocracia desapareceu da cena dos eventos históricos e leva uma existência po9ramente privada. A vitoria da classe média é indubitável e incontestável (...), O Racionalismo econômico que acompanha o avanço da industrialização e a vitoria total do capitalismo, o progresso das ciências históricas e exatas (Hauser,Arnold.historia social da arte e da literatura, Ed. Martins Fontes,São Paulo,2003)

A restauração da Dinastia de Bourbons em França (1815), e a politica reacionária que acompanhou toda a Europa, a queda de Napoleão, foram incapazes de deter o desenvolvimento da vida moderna e sua evolução política e econômica. As idéias da Revolução Francesa se tinham difundido; duas instituições cuja origem remota à época revolucionaria e napoleônica, o ensino elementar e o serviço militar obrigatório, se introduzem pouco a pouco em muitos países europeus; contribuíram para mobilizar as massas e fazê-las participar conscientemente da vida publica. O progresso cientifico e técnico modificava rapidamente o ritmo e as condições da vida material (...), trazia também a dominação mais ou menos manifesta da burguesia capitalista.(Auerbach, Erich, Vista de olhos ao ultimo século.in.Introdução aos estudos literários, 2ª Ed.São Paulo, Cultrix, 1972,p.235

Realismo
O Realismo fundou uma Escola artística que surge na 2ª metade do século XIX em reação ao Romantismo e se desenvolve baseada na observação da realidade, na razão e na ciência. O Realismo é um movimento artístico surgido na França, e cuja influencia se estendeu a numerosos países europeus.

A corrente estética realista busca retratar a realidade de forma objetiva, fotográfica, documental, sem participação do subjetivismo do artista afim de aproximar da imitação da vida real, O realismo procurar apresentar a verdade. É essencial a verossimilhança dos arranjo dos fatos selecionados. O realismo procura essa verdade por meio do retrato fiel dos personagens. As personagens do Realismo são antes indivíduos concretos, conhecidos, do tipo genéricos.
O Realismo retrata a vida contemporânea. Sua preocupação é com os homens e mulheres, emoções e temperamentos, sucessos e fracassos da vida do momento. Esse senso do contemporâneo é essencial ao temperamento realista, do mesmo modo que o romântico se volta para o passado ou para o futuro.ele encara o presente, nas minas, nos cortiços, nas cidades, nas fábricas, na política, nos negócios, nas relações conjugais, etc. qualquer motivo de conflito do homem com seu ambiente ou circunstancias é assunto para o realista.
Além disso, o Realismo retira a maior soma de efeitos do uso de detalhes específicos e escolhe a linguagem mais próxima da realidade, da simplicidade, da maturidade, uma característica comum ao Realismo é o seu forte poder de critica.

A Dama das Camélias

A Dama das Camélias inaugurou o teatro realista francês. O Roman CE original migrou para o teatro, para a ópera e para o cinema. O teatro realista francês almejava descrever a vida nas ruas de Paris e encontrar soluções para os problemas existentes como, por exemplo, a prostituição.
A narrativa é composta por flasher, considerados por alguns críticos como autobiográficos, que contam os desencontros de um amor impossível vivido pelo autor. O clássico Nara a historia de uma requintada e elegante cortesã francesa, em meados do século XIX, mantida por ricos clientes, da emergente burguesia urbana. A cortesã mantém um romance com Armand, que é impedido pela segregação social da sociedade burguesa. O pai do jovem trama a separação e convence a Dama que a relação e uma ruína para a família e para o futuro de Armand, ela acaba por comover-se. Devido a tal atitude de resignação passa a ser reconhecida pela sociedade como a cortesã mais honesta, humana e guardiã da falsa burguesia.
A obra situa-se em plena revolução de 1848 na França, em meio à condenação moral de todo luxo e dos prazeres superficiais oferecidos pela riqueza a uns poucos privilegiados, e alheia a essas agitações políticas, preparava-se a encenação de “A Dama das Camélias”. Para além do alheamento político, o drama captava algo do gosto popular que mantém até hoje, o poder de nos comover, e espelhava a “fuga” inútil das camadas sociais mais altas para uma vida de formalidades sociais e divertimentos. Nascido de uma ligação amorosa vivida pelo autor, o drama retrata a paixão profunda entre uma prostituta rica e um jovem menos abastado. Em seus encontros, embebidos no ambiente fútil das diversões decadentes da alta classe. Sentimos o estranhamento, a dolorosa indiferença desse ambiente à insistência frágil do sentimento que quer se realizar contra o veneno “sensato” das aparências sociais, que precisam ser fatalmente mentidas.

Ópera La Traviata de Giuseppe Verdi

La Traviata é uma Òpera em três actos de Giuseppe Verdi com Libreto de Francesco Maria Plave, baseado no romance “A Dama das Camélias”, de Alexandre Dumas Filho. Conta o drama de Violetta Valéry, prometida ao Barão Douphol e por quem o jovem Alfredo Germont, de rica família provençal se apaixona, para desgosto de Giogio Germont, seu pai, que não gostaria de ver o filho envolvido com uma mulher mundana.

Breve comentário sobre a parte inicial do Romance “A Dama das Camélias”

A narrativa de inicia no espaço que está à venda, após a morte da cortesã que o habitava. A construção do espaço reflete o luxo e se opõe a efemeridade da vida diante da morte da personagem. O autor estabelece um paralelo a historia de outra cortesã. Assim, o leitor construirá uma releitura da imagem construída sobre a prostituta sob um prisma mais complacente e humano.
Além disso, observa-se a construção da verossimilhança realista mediante a comprovação dos fatos narrados com a utilização de dados do cotidiano e da realidade como, por exemplo, anúncios, cartas, cartazes, endereços e descrições, minuciosas de aspectos físicos dos personagens e do espaço em que os personagens encontram-se.

Em forma oval de encanto indescritível, imagem uns olhos negros, cujas sobrancelhas em forma de arcos perfeitos, parecem pintados; cubram esses olhos longos cílios que, ao se fecharem, lançam sombra sobre o tom rosado das faces, tracem um nariz fino, retilíneo, gracioso, com narinas um pouco abertas por uma aspiração ardente para a vida sensual; desenham uma boca harmoniosa, com lábios abrindo-se graciosamente sobre dentes brancos como leite, cubram a pele com o aveludado de um pêssego que Mão nenhuma tivesse ainda tocado, e terão o conjunto dessa encantadora cabeça.
Longe de nós pensar em fazer de nossa heroína algo diferente do que ela era.
(Filho, Alexandre Dumas, A Dama das Camélias.ed. Martin Claret, São Paulo, 2008

domingo, 5 de abril de 2009

Tennessee Wiliams

Tennesse Wiliams, cujo verdadeiro nome era Thomas Lanier Williams, foi um dos mais importantes nomes do teatro pós I Guerra Mundial. Suas obras deixam inúmeras possibilidades de leitura que ultrapassam as análises psicológicas que geralmente são feitas no que diz respeito ao tema da loucura e da cultura sulista.
Em Um Bonde Chamado Desejo, peça que estreou na Broadway em 1945, com direção de Elias Kazan, o autor tem constante atenção com a delicadeza, fragilidade e complexidade psicológica de suas personagens derrotadas pela mudança dos tempos e vencidas pela circunstancias. Arthur Miller, outro grande autor americano do século XX, ressaltava que a peça era como se fosse um grito de dor. Miller também observa que, com “Um Bonde Chamado Desejo", inaugura-se na dramaturgia norte-americana um tipo de texto que coloca a linguagem a serviço das personagens e não (como até então era feito), a serviço da trama, do desenrolar da historia. As personagens mostram-se livres em suas falas a ponto de conseguirem expor verbalmente suas contrariedades. As falas expressam o dito e comunicam o não dito.
Tennessee põe nos objetos de cena itens que funcionam como símbolos para o subtexto da peça e deixa para o expectador descobrir outros símbolos e paralelismos,a começar pelo do ‘Bonde, Desejo. “Um Bonde Chamado Desejo”, valeu ao autor o prémio Pulitzer e o ator Marlon Brando personificou como objeto de desejo sexual, que inaugurou na historia dos Estados Unidos o reconhecimento de que existe a luxuria feminina. Com isso, Tennessee teria tocado em um importante tabu da sociedade norte americana daquela época: as mulheres sentem atração sexual pelos homens.

A crítica literária acadêmica coloca Tennessee Wiliams entre os grandes nomes da dramaturgia norte americana do século XX, na companhia de Eugene O’Neill, Arthur Miller e Edward Albee.
Gore Vidal nos conta que Tennessee Wiliams (Thomas Lanier Wiliams, 1911-1983) , nascido e criado no sul dos Estados Unidos, tinha em sua família de origem inspiração para a maioria das personagens sobre as quais ele escreveria durante toda a sua carreira de ficcionista: Rose, a irmã que foi submetida a uma lobotomia, e Edwina, a mãe. Que concordou com os médicos que recomendaram a lobotomia da filha. O pai, Cornelius, extrovertido e alcoolista, sempre brigando com a esposa que, diante de toda e qualquer situação, jamais perdia a pose de uma lady:um pai sempre beligerante em relação ao filho homossexual; um ai que pode ter tentado abusar sexualmente da filha. O avô, Reverendo Dakin, que inexplicavelmente passou para estranhos todo o seu dinheiro (ao que parece chantageado por causa de um encontro que teve com um rapaz), a avó, Rose, como a neta, mulher generosa que tudo aceitava sem questionar.
Em Um Bonde Chamado Desejo, temos na personagem Blanche Dubois uma herdeira de refinamento e da fragilidade de uma aristocracia decadente do sul dos Estados Unidos, a representante de uma linhagem que vive das lembranças de sua velha tradição. Paralelamente a isso, Blanche vive também das lembranças do auge de sua juventude.
Tennessee teria dito ao amigo Gore Vidal que era incapaz de escrever uma historia que não tivesse pelo menos uma personagem pela qual ele sentisse desejo físico. Em Um Bode Chamado Desejo, temos no cunhado de Blanche, Stanley Kowalski, um trabalhador braçal que Blanche descreve como “um animal”. Contudo, vemos que a simpatia do autor não está com o belo Stanley, mas deposita-se em sua vítima, Blanche.
Tenneessee põe nos objetos de cena itens que funcionam como símbolo para o subtexto da peça. As coloridas lanternas de papel chinesa fazem um paralelo com a fragilidade de Blanche. O gesto de Stanley, em sua primeira aparição em cena, gritando pela mulher e depois jogando para ela um pedaço de carne, faz um paralelo com seu comportamento não civilizado de homem das “cavernas” ou animal.
O escritor utiliza nomes estrangeiros para simbolizar personagens cheios de vida, estabelecendo um contraste com os anglo saxões sexualmente insípidos. O autor indica a influencia do escritor inglês D.H.Lawrence que propõe o sexo como uma ação libertadora do homem e da mulher da sociedade puritana e repressora, inscrevendo, portanto , a sexualidade humana como um agente libertador e político, muito antes das inúmeras revoluções de comportamento durante os anos 1960. desse modo, o estrangeiro pode ser visto como o elemento estranho e perturbador que atrai a mulher norte americana.

Quando a forma, Tenneesse parece valorizar a concentração das personagens em uma determinada crise, em que tudo adquire o valor de uma falsa revelação ou conciliação insatisfatória. A mesma conciliação insatisfatória pode ser encontrada na conclusão de “Um Bonde Chamado Desejo”, quando não há uma indicação precisa de destino de Blanche e das demais personagens.
O mistério e um elemento comum na caracterização dramática para que haja a suspensão do espectador na criação das suas expectativas, quanto à cena apresentada no palco.
O autor não se interessa em apontar um culpado para a tragédia de Blanche. A analise critica de uma sociedade corroída pelo egoísmo e pela loucura é o que interessa ao dramaturgo.
Na opinião de S.Falk “ T Wiliams é imparcial, pois ele valoriza tanto o homem primitivo quanto a aristocracia decadente. “ o autor teria o habito de se identificar com o ponto de vista das suas personagens femininas, cuja fragilidade opõe-se ao mundo viril dos homens. De qualquer forma, o escritor não está interessado no otimismo ingênuo do norte americano ao valorizar a vitoria de Stanley sobre Dlanche , a não ser a derrota coletiva da sociedade incapaz de lidar com as diferenças. A perspectiva temporal de Stanley é típica da sociedade contemporânea, orientada pela mentalidade pratica. O passado da família Dubois não tem valor porque não é mais utilizável, assim com a cultura, a sensibilidade e tantas outras abstrações que não parecem ter serventia para uma sociedade tão preocupada com o lucro.
A tragédia de Blanche é muito mais uma tragédia coletiva de que individual, pois ela escancara as estruturas de pode de poder de uma sociedade incapaz de lidar com seus doentes, suas derrotas e perdas pessoais.
Por outro lado, a tragédia de Blanche também pode ser vista como uma falsa tragédia, pois não há catarse possível e não há legitimidade para a personagem nem diante do seu passado, nem diante da sua condição presente de vida. Não sabemos até que ponto as próprias reminiscências de Blanche são verdadeiras.
Tennessee mostra que Blanche ao executar a tarefa de entreter Mitch em um encontro e fracassa, a personagem reconhece o papel das mulheres na sociedade tradicional que devem satisfazer seus homens a partir de uma representação da mulher frágil e submissa ou entregar-se aos homens como prostituta. Para o patriarcado protestante, há apenas um vértice de representação feminina e este parece oscilar entre a imagem de Santa e da Prostituta.
É interessante rever os sinos da Igreja como o despertar para uma nova consciência da personagem. Blanche ouve os sinos da catedral antes de ir para o hospício.

Podemos concluir que embora Tenneesse Wiliams pertença a uma tradição de um teatro calçado no drama familiar, ele buscou analisar o macrocosmo da sociedade de classe media americana a partir do espaço individual. Mesmo quando a família aparece no material apresentado, não é ela, necessariamente que está em foco, e sim as distorções que são produzidas em seu interior pelo sistema ideológico dominante, pela ideologia do sucesso e do consumo.
Tennessee é herdeiro de uma tradição de teatro moderno iniciado por Ibsen, Tchekhov e Strindberg. Ibsen dissecava a sociedade burguesa e apresentava sua decadência moral.Tennessee defendia uma crítica aos padrões estabelecidos pelo “mainstream” que pode ser compreendido como uma representação de valores do patriarcado protestante, cujo ensejo é preservar o direito à propriedade e a manutenção da unidade familiar, sobretudo, desconsiderando o marginalizado, “os perdedores”e os fora do padrão normativo”. Com um material perfeito para um melodrama, o autor frustra as expectativas do público de classe média, quando encerra a maioria de suas peças com um final não conciliador, ou seja, em aberto. Dessa forma, ele lança um olhar crítico e distanciado sobre a sociedade norte americana, uma vez que se recusa a julgar as personagens e estabelecer morais de conduta.

Eugene O'Neill

O realismo foi um movimento artístico e cultural que se desenvolveu na segunda metade do século XIX. A característica principal deste movimento foi a abordagem de temas sociais e um tratamento objetivo da realidade do ser humano. Possuía um forte caráter ideológico, marcado por uma linguagem política e de denúncia dos problemas sociais como, por exemplo: miséria, pobreza, exploração, corrupção entre outros. Como a linguagem clara, os artistas e escritores realistas iam diretamente ao foco da questão, reagindo, desta forma, ao subjetivismo do romantismo. Uma das correntes do realismo foi o naturalismo. Onde a objetividade está presente, porém sem o conteúdo ideológico.
No teatro realista o herói romântico é trocado por pessoas comuns do cotidiano. Os problemas sociais transformam-se em temas para os dramaturgos realistas. A linguagem sofisticada do romantismo é deixada de lado e entra em cena as palavras comuns do povo.
Nascido em Nova York (16/10/1888-27/11/1993), Eugene Gladstone O'Neill, foi um dramaturgo anarquista e socialista, vencedor do Nobel de Literatura em 1936 e do Prêmio Pulitzer por várias vezes.
Suas peças estão entre as primeiras a introduzir as técnicas do realismo influenciado principalmente por Anton Chekhov, Henrik Ibsen e August Strindberg. Sua dramaturgia envolve personagens que habitam as margens da sociedade com seu comportamento desregrado, tentando manter inalcansáveis aspirações e esperanças do milagre Norte-Americano ‘.tendo escrito apenas uma comédia (Ah Wilderness), todas as suas peças desenvolvem graus de tragédias pessoal e pessimismo. Sua dramaturgia influencia reconhecidamente um importante dramaturgo brasileiro: Nelson Rodrigues.

Infância e adolescência

Eugene O”Neill nasceu em um hotel na Broadway como o terceiro filho de uma família onde o segundo filho, Edmund (1885) havia falecido com um ano e meio de idade vitima de saramo. Seu pai, James O’Neill (1849-1920) era um ator irlandês, que em 1850 veio com seus pais aos Estados Unidos, teve uma vida simples e nunca se curou de uma avareza doentia, desenvolvida durante os tempos difíceis. Eugene O’Neill viajou quando criança com os pais e com o irmão mais velho, James Jr. (1878-1923) na turnê do pai por todo os Estados Unidos e portanto conheceu o teatro desde muito cedo. O Catolicismo irlandês mais pé-no-chão do pai e o misticismo da Mãe, Ellen Quinlan(1858/1922), criaram uma confusão na cabeça de O’Neill em relação a Deus e a Religião, características que se transcendeu para suas obras.
A insegurança de seus primeiros anos, citada por ele próprio como comparável a um pesadelo (I had no childhood- não tive infância) levou também sua mãe a tornar-se dependente química (abandonando o teatro). Isto fez com que Eugene mais tarde acusasse o pai como sendo o culpado. Quando não estava com a família em Torne, freqüentava internatos variados, até chegar à adolescência, em uma escola não religiosa. Eugene passava algumas de suas férias de verão (entre julho e agosto), com a família em uma casa de campo em New London (Connecticut), após o término do colégio. O’Neill se matriculou na universidade de Princeton, mais precisamente no outono de 1906. entretanto, foi expulso já em junho do ano seguinte por ter arremessado uma garrafa de cerveja pela janela do reitor da universidade, que mais tarde veio a se tornar presidente dos Estados Unidos. Sr. Woodrow Wilson.

Uma vida sem rumo

O’Neill que não tinha mesmo qualquer vontade de cursar a faculdade, não conseguia ficar muito tempo no mesmo trabalho até que conseguiu uma vaga de secretário em uma firma nova-iorquina de entregas, onde seu pai estava empregado. Após o fechamento da empresa, casou-se com a jovem nova iorquina Kathleen Jenkins em outubro de 1909. o casamento não foi aprovado pela família da moça e foi neste mesmo ano que ele resolveu fazer as malas e partir Honduras à procura de ouro na companhia de um engenheiro de mineração. Em março do ano seguinte, devido a melaria O’Neill teve que retornar à Nova Iorque.
O pai de Eugene o fez assistente administrativo do elenco de sua companhia de teatro e viajaram juntos de St.Louis no estado americano de Missouri até Boston, Eugene que não se interessava muito pelo trabalho recém adquirido, aproveitou o fim da viagem e se aventurou em sua primeira viagem pelo mar.
As viagens como marinheiro até a América do Sul e África (65 dias em um navio norueguês de Boston até Buenos Ayres e África do Sul, possibilitou-o manter contato com pessoas desertores, exilados e marginais e todo tipo que auxliaram-no na formação de seu caráter.
Na Argentina Eugene encontrou emprego no departamento de desenho técnico da Companhia Elétrica Westinghouse, depois trabalhou em uma ‘Wollpackanlage em La Plata e por fim no escritório da fábrica de maquinas de costura Singer em Buenos Ayres.
Seguiu então viagem para Durban na África do Sul e em seguida voltou para a Argentina como peão em uma transportadora de gado.
Eugene permaneceu muito tempo sem recursos vivendo como desabrigado e alcoólatra no bairro próximo ao porto de Buenos Ayres e da mesma maneira viveu em Nova York e posteriormente em Liverpool na Inglaterra. Finalmente engajou-se na profissão de marinheiro em um navio inglês. Em seguida veio sua última viagem pelo mar como marujo na linha americana New York Southampton .

Aos 23 anos entrou para o elenco de seu pai em uma pequena peça entre (1911/1912 , e trabalhou. Após voltar de uma viagem de 15 semanas com a família em New London por quase seis meses como repórter no New London Telegraph, em que escreveu poemas (em sua maioria satíricos) do mês de agosto ao dia 24 de dezembro. O editor do jornal tinha por ele uma grande simpatia, apesar da inconfundível visão de O’Neill Frederik Latimer foi também o primeiro que reconheceu em O’Neill o talento nato.
Após uma tentativa de suicídio em 1912 e o rompimento de seu curto casamento com Kathleen Jenkins no mesmo ano (pouco antes do nascimento do pequeno Eugene Jr. – O garoto só veio a conhecer o pai por volta dos doze anos deidade 1923) O’Neill permaneceu cinco meses em um sanatório na fazenda de Gaylord para tratar de tuberculose. Ele não foi algemado em nenhum momento pois a terapia consistia no enrijecimento do corpo. Lá sua saúde voltou ‘mais ou menos’ ao normal parou-se o avanço da doença. E este acontecimento marcou a cisão do período desregrado e sem rumo que viveu.

Primeira peça de O’neill Rumo a Cardiff , estreou no teatro em Provincetown, Massachusetts. No Sanatório leu Ibsen, Strindberg, Nietzche e Dostoievski compulsivamente e sentiu que escrever era o que queria fazer pelo resto de sua vida. Pela primeira vez sentiu o prazer de impulso que o levou a escrever peças e trabalhar artisticamente as expressões vividas até então. Após sua saída na primavera seguinte (1913), permaneceu por um tempo em casa, e assim que a temporada começou novamente foi morar durante pouco mais de um ano com uma família inglesa. Neste período Eugene leu muito, meditou, praticou esportes, nadou diariamente pelas manhãs (mesmo no inverno), e acima de tudo escreveu muito: em um período de 15 meses escreveu onze peças de um ato, dois dramas e alguns poemas. Por seu drama. ‘Além do Horizonte’ , Eugene foi consagrado com o Premio Pulitzer em 1920. foi o primeiro dramaturgo americano a receber o prêmio Nobel de Literatura 91936), pela força , verdade e sentimentos profundos que trouxe à sua obra dramática ao encarnar uma idéia própria de tragédia.
O’Neill se refere em suas peças a personagens inteiramente despedaçados que tentam através de auto- enganação e embriagês fugir da responsabilidade sobre suas vidas. Com realismo radical expõe o abismo de suas personagens. Que sobrevivem de culpas recalcadas, sentimentos falsos e resignação e que se envolvem em lutas sem sentimento uns com os outros. As referencias de O’Neill às tragédias gregas não são claras na sua trilogia em 13 atos ‘Electra enlutada’ (1913), As ligações mais claras entre a vida de O’Neill e sua obra estão na peça ‘Longa Jornada noite adentro” (1941), que a estréia apenas foi liberada muito tempo após sua morte, conforme previu seu testamento. Ele deixou a seguinte frase para sua esposa na dedicatória da peça: Te presenteio o manuscrito original desta peça. Ela fala de magoas antigas e foi escrita com muitas lagrimas e sangue. Ele conseguiu passar ao papel uma auto-imagem através do personagem Edmund, em um mundo sem sentido e imponderável.
Morreu em 1953 em um hotel em Boston, vitima de Tuberculose. “Nasci num quarto de hotel e morri num maldito quarto de hotel, poderiam ter sido suas últimas palavras”.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Stanislavski e a construção da personagem


O conceito de criação da personagem reconhece que todos os seres humanos são diferentes. Como nunca encontraremos duas pessoas iguais na vida, também nunca encontraremos duas personagens idênticas em peças teatrais. Aquilo que faz suas diferenças faz delas personagens. O público que vai ao teatro tem o direito de ver Treplev (personagem de A Gaivota, de Tchekov) hoje e Hamlet na semana seguinte, e não o mesmo ator com sua própria personalidade e seus próprios maneirismos. Embora possam ser desempenhados pelo mesmo ator, são dois homens distintos com suas personalidades e características próprias. Mas não se pode vestir uma personagem do mesmo jeito que veste um figurino. A criação da personagem é um processo.

O ator precisa de uma perspectiva sobre o papel: o que ele pensa sobre a personagem e o que ele quer dizer através dela. Mas, para fazer isso, é importante lembrar que a personagem também tem sua própria perspectiva, a ótica através da qual ela percebe seu mundo. Ao longo da peça, a personagem passa pelas duas horas mais importantes de sua vida, enfrenta problemas que nunca enfrentou antes e faz coisas que nunca fez. E, portanto, muitas vezes não tem uma maneira habitual de agir. Por isso, a personagem é capaz de se surpreender e até, às vezes, ser contraditória. Nenhum personagem é completo, mesmo os heróis gregos tinham suas falhas trágicas. Modernamente, a dramaturgia nos oferece pais exemplares que se apaixonam perdidamente por travestis.
O primeiro contato do ator com a personagem se dá por intermédio do seu problema humano. Esta relação entre a situação objetiva da personagem e a íntima necessidade pessoal de transformá-la, cria uma síntese dos lados objetivo e subjetivo da personagem. A ação torna visível a vida interna e cria uma base para a experiência vivenciada. Esta síntese leva a uma visão artística do papel onde a expressão externa não está separada do conteúdo da experiência humana. Os objetivos a serem atingidos orientam a personagem ao longo da peça. A cada instante a personagem reavalia sua situação perante seu objetivo e disso surge a necessidade de agir.

É comum identificar o lado psicológico (a vida interna) da personagem com as suas emoções. Na verdade, Stanislavski, elaborador do sistema para o ator, se preocupou durante toda sua vida artística com o problema da criação da experiência verdadeira. Ele entendeu que as emoções não estão sujeitas a nossa vontade, e sim ao resultado de um processo de vida. Elas não podem ser atingidas diretamente. A ação é o indicador mais preciso da personagem. É inútil elaborar como a personagem vai agir sem saber qual ação que vai fazer.

Por ação entendemos um ato que envolve o ser humano inteiro na tentativa de atingir um objetivo específico. Na ação orgânica o desejo, pensamento, vontade, sentimento e corpo estão unidos. De fato, o homem inteiro participa da ação, por isso sua importância na criação da personagem. Agimos a partir de nossas percepções. Elas e nossas ações expressam quem somos nós.
Percebemos, avaliamos e depois agimos. O interior, que é invisível, se torna externo, visível e artístico através da ação. Entendido que as emoções surgem durante o processo de ação. “A lógica dos pensamentos gera a lógica das ações, que gera a lógica das emoções”.

A personagem se diferencia do ator de duas formas distintas, ambas relacionadas com a ação. Como indivíduos, somos capazes de empreender uma grande variedade de ações. A personagem ameaça e o ator também pode ameaçar. A personagem consola, mas o personagem também o faz. Mas o diferencia o ator da personagem não são as ações simples, individualmente (ameaçar, consolar, desejar), mas a “ação complexa” – o conjunto dessas ações simples que está dirigida a um objetivo, único, provido de coerência e lógica próprias.
Trabalhando e experimentando esta coerência ou lógica de ações que não pertencem ao ator e sim à personagem, o ator começa a entrar no fluxo de vida da personagem.

Ao longo de uma peça, a personagem é capaz de realizar um número significante de ações que constituem uma linha contínua que atravessa todo o texto. A linha contínua de ações é a linha consecutiva de ações de uma personagem que o ator desenvolve a fim de reforçar a lógica e seqüência de seu comportamento no papel. Serve-lhe da mesma forma que uma partitura serve ao pianista, dando ao seu desempenho unidade, ordem e perspectiva.
Um conceito básico de criação da personagem: ela existe a partir de sua lógica de ações. Criar a linha contínua de ações de uma personagem com sua lógica de ações envolve o ator com sua mente, alma e corpo juntos, numa pesquisa psicofísica.

A personagem se diferencia do ator no que diz respeito à lógica de ações e no que diz respeito à maneira de agir. Além da linha contínua das ações com sua coerência própria, o ator também se preocupa com as características da personagem.
A composição de hábitos de comportamento é chamada de caracterização. Muitos atores encaram seu trabalho como o descobrimento do gestual particular da personagem.
O problema da caracterização tem duas vertentes. O ser humano existe como indivíduo e como integrante de um grupo social. Dar individualidade e agregar características que situem a personagem a seus respectivos grupos sociais.
As classes sociais, as profissões, as faixas etárias, demonstram comportamento compartilhado que é imediatamente reconhecível. O comportamento humano também muda de país para país e de época para época.

Os atores de A gaivota, que retrata várias camadas da sociedade russa do final do século XIX precisam ser sensíveis ao fato de que suas personagens se apropriam dos padrões de comportamento de um outro país e de uma outra época. Também, dentro dessa sociedade, as pessoas estão separadas pelas classes e funções sociais – uma ampla pesquisa é necessária para qualquer peça que fuja de nossa época atual. Mas precisamos ficar atentos a observações superficiais e tentação de criar verdades absolutas. É verdade que militares, em geral, compartilham características próprias que os diferem dos surfistas, por exemplo, mas nem todos os militares são, e pode mesmo haver um militar/surfista. O que quero dizer é que há muitas personagens pertencentes a quadros muito característicos, mas que fogem às características mais marcantes de seus quadros.

Dentro dos grupos, cada ser humano é um indivíduo com suas características próprias. E o que as determina como características individuais, ou, melhor dizendo, como modos de comportamento são peculiaridades interessantes, como um andar diferente, por exemplo, ou um andar desleixado, ou um falar monótono e agudo, uma risada histriônica, etc. Enfim, características que se somem em um indivíduo e que componham sua personalidade. É evidente que essas manifestações externas devem estar associadas as realidades interna e mais profundas da personagem.

Na descoberta de uma lógica de ação única e indispensável, o ator percebe que a personagem demonstra certas tendências de ação. Por exemplo: Treplev explode em quase todas as suas cenas, mas ao invés de reconhecermos nele unicamente um personagem explosivo, devemos estar atentos para os motivos que o levam a explodir. É preciso lembrar que o tempo da peça é o tempo em que a vida da personagem está no limite. Questionando os fatos que o levam a perder a cabeça, temos um primeiro passo para estabelecer uma fisicalidade da personagem. Temos a base de sua composição física, temos o como fazer. Ao adaptar seu corpo a situação em que se encontra a personagem, o ator começa a compor seu papel.

Finalmente, o que vai distinguir a personagem do ator é a forma como a ação da personagem é executada. Hamlet vai inevitavelmente ameaçar de forma diferente da que faria o ator, pois, além do fato de que cada ser humano ser único e a personagem ser um ser humano, para caracterizar o ator precisa recompor seu próprio comportamento. Para fazer isso, sem cair na imitação fácil, é necessário transformar os componentes da ação interna e externa que são suscetíveis ao nosso controle: ação física, estado físico, tempo e ritmo, monólogo interior, pensamentos. Este processo se estende pelo período de ensaios e temporada, e até depois.É comum um ator inexperiente e mesmo experientes rejeitarem novos modos de agir – é mais cômodo apostar na naturalidade, no espontâneo e mesmo nos clichês para compor as personagens porque compor uma personagem meticulosamente, passo a passo, rejeitando diversas tentativas até encontrar um caminho satisfatório é tarefa árdua. A descoberta de uma ação psicofísica única e indispensável da personagem, que o sintetize, significa também em certa medida, a “morte” do ator e sua “reencarnação” dentro da personagem, e isso gera medo e nem sempre é desejado pelos próprios atores.