quarta-feira, 30 de abril de 2008

Aristófanes e a Comédia Antiga


A palavra “comédia” é derivada dos komos: orgias noturnas nas quais os cavalheiros da sociedade Ática se despojam de toda a sua dignidade por alguns dias, em nome de Dioniso, e saciavam toda sua sede de bebida, dança e amor. Aos komos, juntaram-se, no século V, os comediantes dóricos, com falos e enormes barrigas falsas; eram mestres da farsa improvisada.

Quando Aristófanes inscreveu Os Banqueteadores, em 427 aC. ele o fez sob o pseudônimo de Filonides, nome de um ator seu amigo, possivelmente porque era muito jovem para competir no Agon.
A comédia Ática antiga é um precursor brilhante daquilo que viria a ser, muitos anos depois, a caricatura política e o teatro de cabaré. Nenhum político, funcionário ou colega autor estava a salvo de seus ataques. Até mesmo os esplêndidos novos edifícios de Péricles foram motivos de escárnio.
Os quatro grandes rivais em polêmica e veneno, da comédia antiga, eram todos atenienses: Crates, Cratino, Espólide e, Aristófanes. Aristófanes gostava de dirigir sua habilidade artística para a política corrente; adorava terçar as armas com os grandes homens de sua época, crivando de flechas venenosas, como que num show de gracejos maliciosos, seus calcanhares de Aquiles. As obscenidades com as quais o “impudente favorito das Graças” empreendia seus trabalhos de “castigar o povo e os homens poderosos”, as rudes piadas fálicas, os coros de pássaros, rãs e nuvens – tudo se vale da herança cultural das desenfreadas orgias satíricas das danças animais e das festas de colheita.
As origens da comédia, de acordo com Aristóteles, residem nas cerimônias fálicas e canções que, em sua época, eram ainda comuns em muitas cidades. O teatro era o fórum onde eram travadas as mais veementes controvérsias. Aristófanes via a si mesmo como o defensor dos deuses. Ele acusava os filósofos de “arrogante desprezo pelo povo”, e os denunciava como ateus obscurantistas – todos eles, e especialmente Sócrates.
Pouco se sabe sobre a formação e a vida de Aristófanes. Parece ter nascido por volta de 445 a.C. e viveu em Atenas durante toda a sua vida criativa, ou seja, da época em que escreveu sua primeira peça, Os Banqueteadores, até o ano em que escreveu a última, A Riqueza, ou Plutus, em 388 a.C. Das quarenta comédias que sabemos terem sido compostas por ele, conservaram-se apenas onze. Cada uma de suas peças é porta-voz de uma idéia apaixonada, pela qual o autor batalha com impetuosa militância. Na obra de Aristófanes, passagens de agressividade crua alternavam-se com estrofes corais da mais alta beleza lírica. Ironia, escárnio, uma preocupação permanente com a democracia.
Não apenas um ator individual, mas também o coro, podia dirigir-se diretamente à platéia. Com essa finalidade, a comédia antiga desenvolvera a parábase, um expediente formal especifico de que Aristófanes fez uso magistral. No final do primeiro ato, o coro deveria tirar suas máscaras e caminhar até a frente, na extremidade da orchestra, para dirigir-se à platéia. Seguia-se então, uma polêmica versão das opiniões do autor a respeito de acontecimentos locais, controvérsias políticas e pessoais e, não menos importante, uma tentativa de captar a simpatia do publico por sua obra. A parábase, podia ser igualmente usada para justificar, desmentir ou retratar algum acontecimento recentemente ocorrido.
Os espetáculos da Comédia Antiga aconteciam no edifício teatral, com suas paredes de madeira pintadas e painéis de tecido, enquanto o coro, como na tragédia clássica, ficava na orchestra. para cenas de “transporte aéreo” usava-se o teto da skene.
As máscaras da Comédia Antiga vão desde as grotescas cabeças de animais até os retratos caricaturas. Quando houve necessidade de uma mascara de Cléon para os cavaleiros, conta-se que nenhum artesão quis fazer uma. Pela primeira vez, ao que parecia, o medo da cólera da vitima projetava a sua sombra sobre a liberdade democrática do teatro. O ator que interpretava Cléon surgiu sem máscara, como rosto simplesmente pintado de vermelho. Pensa-se que o próprio Aristófanes tenha feito o papel, possivelmente uma razão e mais para a surra que recebeu logo depois.
Como as máscaras de animais, também as danças da comédia Antiga tinham origem culturais. Fontes antigas descrevem-na como tão licenciosamente obscena que dança-la sem máscaras era tido como vergonhoso. Esta pode ter sido uma das razões pelas quais as mulheres foram excluídas durante muito tempo das representações de comédias. Cléon havia movido uma ação contra ele, acusando-o de insulto às autoridades e de denegrir o Estado diante de estrangeiros, por causa de Os Babilônios. Porém, a democracia ateniense fez justiça ao demos, a decisão do povo: a queixa de Cléon foi rejeitada, e a arte da comédia triunfou.